quarta-feira, 30 de dezembro de 2009


Conselhos para sobreviver ao mundo gospel.
Ricardo Gondim.



O mundo gospel se torna cada dia mais patético; distante do protestantismo; em rota de colisão com o cristianismo apostólico; transformado numa gozação perigosa; adoecendo e enlouquecendo milhares que são moídos numa engrenagem que condena a um duplo inferno.

Não consigo responder a todas as mensagens que entopem minha caixa postal. Milhares pedem socorro. Eu precisaria ter uma equipe de especialistas, todos me ajudando a atender os que me perguntam: “ a maldição do pastor vai pegar mesmo?”; “é preciso aceitar as patadas que recebo do púlpito?”; “em nome da evangelização, devo aturar esses sermões ralos?”.

Realmente não dá mais. A grande mídia propaga o que há de pior entre os evangélicos com petição de dinheiro, venda de “Bíblias fantásticas”, milagres no atacado e simplismos hermenêuticos. As bobagens alcançaram níveis intoleráveis.

O que fazer? Tenho algumas idéias.

Aconselho que os crentes parem de consumir produtos evangélicos por um tempo. Não compre Cd de música ou de pregação - inclusive os meus. Deixe os livros evangélicos encalharem nas prateleiras - idem, para os meus. Depois que baixar a poeira do prejuízo, ficará notória a diferença entre os que fazem missão e os que só negociam.

Não vá a congressos - inclusive o que eu promovo. Passe ao largo dos "louvorzões". Não sintonize o rádio. Boicote todos os programas na televisão. Não comente, nem critique, a pregação de pastores, bispos, evangelistas e apóstolos. Afaste-se! Silencie! Desintoxique mente, alma e espírito da linguagem, pressupostos e lógicas da "teologia da prosperidade". Volte a ler a Bíblia sem nenhum comentário de rodapé. Alimente seu interior em pequenos grupos. Reúna-se com gente de bom senso.

Estanque seus dízimos e ofertas imediatamente. Repense com absoluta isenção onde vai dar dinheiro. Mas prepare-se; no instante em que diminuírem as entradas, os lobos vestidos de pastor subirão o tom das intimidações. Não tenha medo.

Faça essa simples auditoria antes de investir o seu suor em qualquer igreja ou ministério:
Quanto tempo é gasto no culto para pedir dinheiro?
A hora do ofertório vem acompanhada de uma linguagem com “maldição, gafanhoto ou licença legal para ataques do diabo”?
Prometem-se “prosperidade, colheita abundante, bênção, riqueza”, para os que forem fiéis?
Existe alguma suspeita na administração dos recursos arrecadados? – Lembre-se que há dois níveis de integridade: o ético e o contábil. Não basta manter os livros em ordem; o dinheiro também só pode ser gasto no que foi arrecadado.

Se a resposta para alguma dessas perguntas for sim, ninguém deve se sentir culpado quando não der oferta.

So haverá arrependimento no dia em que os auditórios se esvaziarem junto com uma crise financeira - o monumental ufanismo evangélico precisa deflacionar.

Concordo, ninguém agüenta o jeito como as coisas estão.

Soli Deo Gloria.

Publicado com a devida autorização do Pr. Ricardo Gondim

Acesse o site para ver este estudo em seu contexto original, entre outros estudos.

www.ricardogondim.com.br

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

O Que Você Precisa Saber Sobre o Dízimo

“E Jesus, respondendo, disse-lhes: Porventura não errais vós em razão de não saberdes as Escrituras...? Mc 12.24

“O dízimo é mandamento para a Igreja!”

“Quem não entrega o dízimo é rebelde!”

“O dízimo é um ato de sacrifício do crente e pelo seu sacrifício Deus te abençoará!”

“Quem quiser ser abençoado por Deus tem que ser dizimista!”

“Não dar o dízimo é roubar a Deus!”

“Quem não dá o dízimo é ladrão!”

“Aquele que não é dizimista não vai para o céu!”

“Deus vai repreender o Devorador (diabo) se você der o dízimo!”

“O crente fiel tem a obrigação de dizimar!”

“Até o descrente que for dizimista Deus abençoa!”

“O obreiro que não for dizimista não serve para ser obreiro!”

“Quem quiser ser abençoado por Deus tem que ser dizimista!”

“Jesus ensinou que devemos dar o dízimo e os Apóstolos também ensinaram isso!”

“Já que Deus é Dono de tudo e pede apenas dez por cento de sua renda, então, após você pagar seus impostos e comprar o necessário para a sua subsistência, o que sobrar, deve ser dado ao Senhor!”

“Deus vai esfregar esterco na cara de quem não é dizimista!”

Essas são algumas de inúmeras frases que nós ouvimos sendo vociferada em alto e bom som nos púlpitos das Igrejas evangélicas. Porém, o que muita gente não parou para analisar a luz das Escrituras, é se o que falam sobre os dízimos está de fato em acordo com o que diz as Escrituras, ou melhor, se tudo o que foi escrito acima, é verdade. Fico aborrecido só em pensar que fui enganado durante quinze anos por essas mentiras, e fico mais aborrecido ainda quando lembro que já defendi essas mesmas mentiras quando de fato, as Escrituras ensinam o contrário. Mas graças a Deus que pelo Seu Espírito nos prometeu guiar em toda a Verdade (Jo 16.13), e também a libertar aqueles que Ele ama e desejam conhecer a Verdade que liberta de todo erro (Jo 8.32,36).

É importante lembrarmos que o Senhor disse que: “A Lei (mosaica) e os Profetas (ou seja, todo o AT) profetizaram até João. Dessa época em diante estão sendo pregadas as Boas Novas do Reino de Deus...” (Lc 16.16). Nota-se neste texto que o Senhor afirma que após o ministério de João é anunciado o Evangelho e não mais a Lei mosaica. O escritor da epístola aos Hebreus salienta que como houve uma mudança de sacerdócio, pois Jesus não pertence ao sacerdócio de Arão, necessariamente teve que ter também uma mudança de Lei (Hb 7.12), os cristãos estão de baixo da Lei da Fé (Rm 3.27) e não da Lei mosaica (Gl 3.12), e Paulo também enfatizou que se não há Lei, logo, não pode haver transgressão da mesma (Rm 4.15).

Por fim, não podemos nos esquecer que devemos lançar mão dos princípios da Hermenêutica e da Exegese bíblica, é preciso verificar para quem foi dirigida essa ou aquela passagem sobre o dízimo, se está no AT ou no NT, ou mesmo em ambos, verificar os versículos anteriores e posteriores ao versículo em questão, etc, então, partindo destes princípios e lançando mão da Hermenêutica e da exegese bíblica, vou analisar detalhadamente todos os versículos que falam acerca do dízimo e que são usados para atacar os membros incautos das igrejas. Pelas Escrituras analisarei para quem foi instituído o dízimo, a qual época pertence, qual a finalidade, e por fim, uma explicação e refutação das frases de efeito que falam nos púlpitos em relação ao dízimo, que tanto amedronta os membros comuns que não tem coragem nem a ousadia de defender a fé cristã.

Assim como Paulo, também fui chamado para a defesa (apologia) do Evangelho (Fp 1.17), portanto, não importo com o que venha a me ocorrer por causa desta apologia contra o dízimo, pois tenho a convicção e o respaldo das Escrituras de que estou do lado da Verdade e fazendo o que me foi ordenado por Deus (Tt 1.11).

Existem pelo menos trinta e seis versículos na tradução ACF (Almeida Revista Fiel) que tratam algo sobre o dízimo, são eles:

- Gn 14.20; 28.22; Lv 27.32; Nm 18.21, 24, 26, 28; Dt 12.6, 11, 17, 18; 14.22, 23, 28; 26.12; 2 Cr 31.5, 6, 12; Ne 10.37, 38; 12.44; 13.5, 12; Am 4.4; Ml 3.8-11; Mt 23.23; Lc 11.42; 18.12; Hb 7.2, 4-6, 8, 9.

Os defensores da Doutrina Malaquiana usam somente Gn 14.20; 28.22; Ml 3.8-11 e Mt 23.23 para apoiarem suas heresias. Mas são os textos de Ml 3.8-11 que os defensores desta doutrina usam e abusam, daí a origem do termo Doutrina Malaquiana.

Antes de analisarmos detalhadamente estes textos, é importante lembrarmos que existem regras para uma correta interpretação dos textos bíblicos, chamados na Teologia de Hermenêutica e Exegese bíblica, que não podemos simplesmente ignorá-los. Usar um texto bíblico fora de seu contexto, imediato ou remoto, acaba gerando um grande pretexto para se fazer uma heresia. Não podemos agir como os sectários que simplesmente adaptam textos isolados para defenderem suas heresias. É preciso verificar cuidadosamente, levar em conta os versículos, capítulos e livros inteiros, os textos anteriores ou posteriores ao texto em questão. Temos que fazer uma análise da época que foi escrito tal texto, usos e costumes dessa época. Há ainda o capítulo em que tal texto está inserido, o Livro ou Carta em que o texto faz parte. Precisamos respeitar o significado que o escritor queria transmitir com aquele texto, e principalmente, é preciso verificar para quem foi dirigido o texto em questão.

Outro ponto que devemos respeitar é que o AT não serve como base para doutrinar os membros da Igreja. Se nós desrespeitarmos qualquer um destes princípios incorreremos no erro de fazer a Palavra de Deus dizer aquilo que ela não diz.

Uma coisa que tenho notado é que para tantas outras passagens do AT que tentam aplicá-las à Igreja, usam-se sem nenhum problema os princípios da hermenêutica e exegese bíblica. Tomemos como exemplo a guarda do sábado pelos cristãos. Porém não usam esses mesmos princípios para interpretar os textos que tratam sobre o dízimo. Isso é no mínimo desonesto.

Por que é que ninguém ensina nas igrejas, nas Escolas Dominicais, nos Cultos de Ensino a verdade sobre o dízimo? É porque se ensinarem isso, as Igrejas não terão como conseguir dinheiro. É porque se alguém ousar ensinar isso poderá ser excluído, disciplinado ou mesmo perder o cargo que ocupam na igreja da qual é membro. A maioria das igrejas não quer viver unicamente das ofertas dos seus membros, daí a necessidade de se exigir o dízimo de seus membros, sob pena de maldição e até, segundo alguns líderes eclesiásticos, a perda da salvação para o membro que não der o dízimo de toda a sua renda.

Mas qual a verdade sobre o dízimo? O que as Escrituras ensinam sobre o dízimo? Antes de percorrermos as páginas das Escrituras, vamos ver o que alguns dos Pais da Igreja falaram acerca do dízimo entre os crentes e quando é que começou a prática desta Lei mosaica entre os crentes.

Vamos dar a palavra ao professor Carlos Alberto Gonçalves Lopes, que fez uma pesquisa sobre o assunto:

“Nos escritos dos pais apostólicos e dos apologistas, não aparecem as palavras comuns para o dízimo; mesmo assim a contribuição (não determinada em porcentagem) continuou na adoração cristã primitiva.

Justino Mártir observa que em cada domingo “aqueles que prosperam e têm esta vontade, contribuíam, cada um na quantidade que quiser. Aquilo que é coletado é depositado com o presidente e ele cuida dos órfãos, das viúvas e dos necessitados (Por acaso vemos o dízimo das igrejas de hoje ser usado para ajudar os órfãos, as viúvas e os pobres... ou tão somente para enriquecer a denominação e dar um alto status de vida aos seus ministros?) e aqueles que estão presos e dos forasteiros que habitam entre nós (Por acaso alguma igreja entrega uma parte do dízimo para ajudar os presos ou, por exemplo, os emigrantes que chegam do Norte e Nordeste do Brasil, em busca de uma vida melhor?) (1 Apol. 67, cf. Também Apost. Const. 2,27).

Irineu considerou o dizimar como lei judaica que não se requer dos cristãos, porque os cristãos receberam a “liberdade” (Gálatas 5:1) e devem dar sem constrangimento (Haer. 4, 18, 2).

Orígenes considerava o dízimo como algo ultrapassado, de longe, pelos cristãos nas suas distribuições (In Num.hom.11). Sendo assim, para os antigos pais da Igreja, bem como para os escritores do Novo Testamento, o dízimo era coisa do passado; agora, um novo princípio para as dádivas os guiava e os impulsionava a compartilhar - a bondade de Deus e a compulsão interna do Espírito Santo.

O início

A adesão da Igreja Católica Apostólica Romana a prática dizimal está longe de ser uma novidade, foi iniciada com a queda do Império Romano, no século IV. A igreja ocupou o vazio do poder, e para evitar o caos financeiro, começou a cobrar o dízimo sob pena de excomunhão (é o que fazem se um membro não for dizimista).

O dízimo foi confirmado oficialmente pelos concílios regionais de Tours (567) e Mácon (585). Mas foi somente a partir de Carlos Magno (779) que o dízimo passou a ser cobrado regularmente.

Esse sistema tributário estendeu-se posteriormente às demais nações cristãs: chegou à Inglaterra no século X. Na península Ibérica os dízimos já eram praticados desde o século VII, em caráter voluntário, e somente 400 anos depois passa a ser obrigatório. Nos dois primeiros concílios de Latrão, em 1123 e 1139, o dízimo foi finalmente incorporado à legislação geral da igreja, de forma definitiva, como a décima parte da renda dos fiéis. Desde então, as igrejas evangélicas copiaram esse modelo que foi iniciado pela apóstata igreja Católica Romana.

O Dízimo, segundo as Escrituras

Gn 14.20; 28.22

“E bendito seja o Deus Altíssimo, que entregou os teus inimigos nas tuas mãos. E Abrão deu-lhe o dízimo de tudo.”

“E esta pedra que tenho posto por coluna será casa de Deus; e de tudo quanto me deres, certamente te darei o dízimo.”

Os defensores da doutrina Malaquiana usam estes dois textos de Gênesis para dizer que o dízimo é antes da Lei, portanto, devemos também dar o dízimo, visto também que Abrão deu o dízimo, devemos seguir-lhe o exemplo, da mesma forma como no suposto exemplo de Jacó.

Porém, analisando detidamente estes dois versículos, vemos os que procuram tornar o dízimo estritamente baseado em dinheiro, obrigatório e rotineiro, afirmando ter ele existido “antes da Lei” por causa destes dois versículos, não estão ensinando como ele realmente foi dado, “antes da Lei”. Antes da Lei foi voluntário, em nenhum momento vemos Deus exigindo de Abrão ou Jacó dar o dízimo, muito pelo contrário. Além do mais, Abrão deu o dízimo dos despojos de guerra e não de sua riqueza pessoal, e também não vemos em nenhum outro lugar das Escrituras Abrão dando o dízimo de seus bens. Jacó prometeu entregar o dízimo SE Deus o abençoasse (conf. Gn 28.20 “Se Deus...”), e nada consta nas Escrituras que ele tenha cumprido seu voto. É curioso notar que não vemos um dos patriarcas que aparece entre estes dois indivíduos usados como exemplo de “dizimistas fieis” dar o dízimo. Refiro-me a Isaque. Em nenhum momento a Bíblia narra que Isaque tenha dizimado, mostrando com isso que tratasse de uma prática comum para os crentes de todas as épocas. Concluindo, estes dois textos não servem como base para exigir a obrigatoriedade da entrega do dízimo do cristão.

Nm 18.21,24; Dt 12.17,18; 14.22, 23, 28; 26.12

Lendo a narrativa bíblica em Nm 18.21,24 vemos que o dízimo recolhido entre os israelitas era dado aos levitas em herança, visto que entre seus irmãos eles não possuíam herança como terra por exemplo:

E eis que aos filhos de Levi tenho dado todos os dízimos em Israel por herança...(vs. 21);

Porque os dízimos dos filhos de Israel, que oferecerem ao Senhor em oferta alçada, tenho dado por herança aos levitas; porquanto eu lhes disse: No meio dos filhos de Israel nenhuma herança terão. (vs. 24).

Isto foi devido ao fato de a tribo de Levi não ter se envolvido no pecado do bezerro de ouro ao pé do monte Sinai (conf. Êx 32.26).

Os textos de Dt 12.17,18 nos mostram que o dízimo era também para ser comido pelo próprio dizimista na presença do Senhor:

Dentro das tuas portas não poderás comer o dízimo do teu grão, nem do mosto, nem do teu azeite, nem os primogênitos das tuas vacas, nem das tuas ovelhas; nem nenhum dos teus votos, que houveres prometido, nem as tuas ofertas voluntárias, nem a oferta alçada da tua mão. Mas os comerás perante o Senhor teu Deus, no lugar que escolher o Senhor teu Deus, tu, e teu filho, e a tua filha, e o teu servo, e a tua serva, e o levita que está dentro das tuas portas; e perante o Senhor teu Deus te alegrarás em tudo em que puseres a tua mão.

E isso também é repetido em Dt 14.23 que diz:

E, perante o Senhor teu Deus, no lugar que escolher para ali fazer habitar o seu nome, comerás os dízimos do teu grão, do teu mosto e do teu azeite, e os primogênitos das tuas vacas e das tuas ovelhas; para que aprendas a temer ao Senhor teu Deus todos os dias.

O verso 22 e o verso 28 deste mesmo capítulo (Dt 14) nos ensinam ainda que os dízimos eram em forma de alimentos:

Certamente darás os dízimos de todo o fruto da tua semente, que cada ano se recolher do campo.(vs. 22);

Ao fim de três anos tirarás todos os dízimos da tua colheita no mesmo ano, e os recolherás dentro das tuas portas.(vs. 28).

Em Dt 26.12, Moisés informa que o dízimo também era para ser dado, não somente aos levitas, mas aos órfãos, às viúvas e aos estrangeiros:

Quando acabares de separar todos os dízimos da tua colheita no ano terceiro, que é o ano dos dízimos, então os darás ao levita, ao estrangeiro, e ao órfão e à viúva, para que comam dentro das tuas portas, e se fartem.

Resumindo, os dízimos recolhidos pela nação israelita eram em forma de alimento. Entendemos por esses textos que havia dois dízimos obrigatórios para a nação israelita (e não para a Igreja): um dízimo anual para o sustento dos levitas (conf. Lv 27.30; Nm 18.21) e outro levado a Jerusalém na festa do Senhor (Dt 14.22). Contudo, a cada três anos, o segundo dízimo devia permanecer na comunidade de cada um, onde eram distribuídos entre os órfãos, as viúvas e peregrinos (Dt 14.28). Outra coisa importante que se nota é que o próprio dizimista desfrutaria (comeria) do seu dízimo, e se alegraria diante do Senhor por isso (conf. Dt 12.18), logo, esses textos não servem como base para se exigir o dízimo da Igreja novitestamentária.

Neemias 13.12 concorda com os textos de Nm 18.21,24 e Dt 14.22,28 de que os dízimos dos israelitas eram sempre em forma de alimentos:

Então todo o Judá trouxe os dízimos do grão, do mosto e do azeite aos celeiros.

Agora vamos dar um grande salto até os textos de Lc 18.9-14 e Hb 7.2, 4-6, 8, 9. Isso devido ao fato de que farei o comentário de Mt 23.23, e por último analisarei o texto de Ml 3.

Em Lc 18.9-14 o Senhor narra a parábola de um fariseu e um publicano que subiram na mesma hora para orar no Templo. O fariseu se gabava por ser legalista ao extremo. Além de ser legalista, ou seja, aquele que baseia sua teologia na Lei mosaica, esse fariseu era um insolente, preconceituoso, e se achava o “tal”. Já o publicano, coitado, nem tinha coragem para adentrar-se totalmente no Templo (v. 13 – “...de longe”), e muito menos possuía coragem para levantar sua cabeça em direção ao céu, mas clamava na sua simplicidade pelo perdão divino. O curioso nessa parábola é que o fariseu dizia de boca cheia, isto é, com orgulho “...dou os dízimos de tudo quanto possuo...”. O dízimo era uma ordenança da Lei, logo, esse fariseu tinha a obrigação de obedecê-la, e mais, ele não precisava ficar se gabando de dar os dízimos de tudo quanto possuía, pois ele não fazia mais do que a sua obrigação pelo fato de viver sob a Lei.

Muitos hoje ficam se gabando como esse fariseu legalista sem vergonha, dizendo que só são abençoados porque dão os dízimos. Semelhantemente como esse fariseu insolente, muitos condenam o coitado do publicano, amaldiçoando-o e até condenando-o ao inferno por não dar o dízimo. Será que no meio dos pecados do publicano da parábola incluía que ele não era dizimista? E por que será que o publicano não disse algo como “...ó Deus, tem misericórdia de mim, pecador, pois não sou dizimista como esse fariseu” (grifo em negrito meu)? Tenho até medo de que possa aparecer algum adepto da doutrina malaquiana e usar o texto de Lc 18.9-14 para dizer que o coitado do publicano não era dizimista!

Hb 7.2, 4-6, 8, 9

“A quem também Abraão deu o dízimo de tudo, e primeiramente é, por interpretação, rei de justiça, e depois também rei de Salém, que é rei de paz;”

“Considerai, pois, quão grande era este, a quem até o patriarca Abraão deu os dízimos dos despojos. E os que dentre os filhos de Levi recebem o sacerdócio têm ordem, segundo a lei, de tomar o dízimo do povo, isto é, de seus irmãos, ainda que tenham saído dos lombos de Abraão. Mas aquele, cuja genealogia não é contada entre eles, tomou dízimos de Abraão, e abençoou o que tinha as promessas.”

“E aqui certamente tomam dízimos homens que morrem; ali, porém, aquele de quem se testifica que vive. E, por assim dizer, por meio de Abraão, até Levi, que recebe dízimos, pagou dízimos.”

Os textos de Hb 7.2, 4-6, 8, 9 não devem e nem podem ser usados como base para se exigir os dízimos dos crentes. A ênfase do capítulo sete de Hebreus é sobre a superioridade do sacerdócio de Cristo representado por Melquisedeque sobre o sacerdócio de Arão representado por Abraão, e não sobre o dízimo.

Em nenhum lugar de Hebreus 7 vemos algum mandamento de se entregar os dízimos nas igrejas. No versículo 11, 12 vemos que a Lei mosaica foi substituída por outra Lei (a de Cristo), pois “...mudando-se o sacerdócio, necessariamente se faz também mudança da lei”. A lei dos dízimos pertence ao sacerdócio de Arão (Lei mosaica) e não à Lei de Cristo.

Mt 23.23

“Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! pois que dizimais a hortelã, o endro e o cominho, e desprezais o mais importante da lei, o juízo, a misericórdia e a fé; deveis, porém, fazer estas coisas, e não omitir aquelas.”

Muitos adeptos da Doutrina Malaquiana já vociferaram de cima dos púlpitos dizendo: “Aqui em Mt 23.23 Jesus está ordenando dar o dízimo!”. Será mesmo que o Senhor está ordenando nesta passagem os crentes darem os dízimos? Analisemos, pois, cuidadosamente Mt 23.23.

No capítulo 23 de Mateus aparece seis vezes a expressão “Ai de vós Escribas e Fariseus...”, pergunto: Para quem o Senhor está dirigindo essa expressão que se encontra do verso 13 ao verso 34? Por acaso o Senhor disse “Ai de vós crentes”? No versículo 23 o Senhor está censurando os escribas e fariseus, e não os crentes. Será que é tão difícil verificar para quem foi dirigida tais palavras em Mt 23.23? Esse versículo está tão claro como o sol do meio dia e não há como colocar outro significado ali. Se foi para os escribas e fariseus que o Senhor falou essas palavras, logo, os crentes estão isentos. E mais, os crentes não podem ser massacrados verbalmente e condenados ao fogo do inferno por não obedecer a uma lei que não lhes diz respeito. Os crentes não devem obedecer a uma Lei que não está mais em vigor (Hb 7.12), então, como não há lei, também não pode haver transgressão da mesma (Rm 4.15).

Os crentes em Cristo não devem e nem tem a obrigação de obedecer a leis que foram instituídas exclusivamente para a nação de Israel. Os escribas e fariseus eram legalistas, portanto deviam mesmo obedecer a lei mosaica no que concerne ao dízimo. E nenhum escritor do NT compara os crentes com os escribas e fariseus. Os únicos que comparam os crentes de hoje com os escribas, fariseus, sacerdotes e levitas são aqueles que querem a todo custo extorquir dinheiro dos crentes. Os crentes são zambujeiro (Rm 11.17)!

Como não há muitos versículos no NT para apoiarem suas heresias, distorcem desesperadamente textos como o de Mt 23.23 para conseguirem seus intentos. Concluindo, esse versículo também não serve para apoiar a Doutrina Malaquiana.

Ml 3.8-11

“Roubará o homem a Deus? Todavia vós me roubais, e dizeis: Em que te roubamos? Nos dízimos e nas ofertas. Com maldição sois amaldiçoados, porque a mim me roubais, sim, toda esta nação. Trazei todos os dízimos à casa do tesouro, para que haja mantimento na minha casa, e depois fazei prova de mim nisto, diz o Senhor dos Exércitos, se eu não vos abrir as janelas do céu, e não derramar sobre vós uma bênção tal até que não haja lugar suficiente para a recolherdes. E por causa de vós repreenderei o devorador, e ele não destruirá os frutos da vossa terra; e a vossa vide no campo não será estéril, diz o Senhor dos Exércitos.”

Finalmente chegamos aos textos preferidos dos que defendem a Doutrina Malaquiana, Ml 3.8-11, daí o termo Doutrina Malaquiana. Esses são os textos mais usados, na verdade abusados a torto e a direito por aqueles que exigem os dízimos dos cristãos. Usam o versículo nove para amedrontar as pessoas afirmando que quem não dizima vai ser amaldiçoado. Já ouvi certa vez um pastor usar Ml 3.8 juntamente com o texto de I Co 6.10 para dizer que aquele que não der o dízimo não vai ser salvo! Acompanha só o raciocínio (se é que podemos chamar isso de raciocínio) desse pastor malaquiano. Se em Ml 3.8 diz que quem não dá o dízimo é ladrão (isso segundo a hermenêutica furada dele), e em I Co 6.10 diz que o ladrão não herdará o Reino de Deus, logo, aquele que não for dizimista não vai para o céu! Fico até com vergonha com a tremenda falta de vergonha com que torcem a hermenêutica e a exegese bíblica para chamar o crente “infiel” nos dízimos de ladrão. Mas vamos analisar esses textos.

Primeiramente devemos levar em conta que a melhor interprete das Escrituras são elas mesmas (conf. Jo 5.39), vamos começar então perguntando para quem foi escrito o livro do profeta Malaquias.

No capítulo 1 de Malaquias, no versículo 1 diz:

Peso da Palavra do Senhor contra Israel, por intermédio de Malaquias.”

Aqui nesta passagem o profeta inicia dirigindo-se contra a nação de Israel. No versículo 6 deste mesmo capítulo vemos Deus dirigindo a palavra ...a vós, ó Sacerdotes...”.

No capítulo 2, verso 1 diz:

Agora, ó sacerdotes, este mandamento é para vós.,

Aqui vemos que a palavra foi dirigida aos sacerdotes novamente. E no versículo 11 deste mesmo capítulo vemos:

Judá tem sido desleal... Judá profanou o santuário...”.

Agora a palavra é dirigida a Judá (a nação). Em Malaquias 3.3 lemos:

...e purificará os filhos de Levi...

Aqui é dirigida aos levitas. E por fim no versículo nove do capítulo 3 lemos:

...porque a mim me roubais, sim, toda esta nação.”.

Para quem foi escrito o livro de Malaquias? Para a nação de Israel, para os levitas e aos sacerdotes? Ou para os crentes da era da Graça? Porque é que em nenhum lugar do NT é repetido a ordem que consta em Ml 3.10?

Quem estava roubando a Deus nos dízimos e nas ofertas era a nação israelita, e não a Igreja. O pecado é de Israel, dos sacerdotes e dos levitas, e não dos crentes. Quem teria que acertas as contas com Deus por causa destas transgressões eram eles e não os crentes. Aplicar Ml 3.8-11 aos crentes é heresia, é condenar inocentes. Acusar os que não são “dizimistas fieis” de roubo é uma acusação gravíssima que pode dar processo judicial.

O pregador Norman Robertson escreveu em um de seus livros que: “Todo cristão que não está honrando Deus com o dízimo é culpado de estar roubando-O; está vivendo sob uma maldição e ficará na escravidão financeira, até que obedeça a Palavra de Deus e comece a dizimar. O dízimo quebra a maldição”. Concordo com o que disse a irmã Mary Schultze em seu artigo DAR O DÍZIMO É PECADO que transcrevo, que quem deveria ser amaldiçoado era esse malaquiano por torcer de tal maneira a Palavra Santa. É isso que um pregador deve dizer a uma pessoa salva? O sacrifício de Cristo não foi suficiente? Será que Cristo removeu todas as maldições, menos a maldição financeira? Isso é um tipo de condenação à indução pelo medo, a qual é opressora, negativa e totalmente antibíblica. Esta declaração mistura a lei com a graça, deixando de manejar corretamente a Palavra da Verdade, constituindo-se em pedra de tropeço, não sendo um artigo de fé e, portanto, sendo um pecado.

A Igreja (templo local) deve sustentar-se por meio das ofertas de seus membros. Ofertas voluntárias. O Senhor falou acerca de ofertas (Mt 5.23, 24) e não de dízimos. Lc 21.1-4 fala da oferta de uma viúva pobre e não sobre dízimo. Em Atos 11.29, 30 Lucas diz que Então, os discípulos, cada um segundo as suas possibilidades, resolveram providenciar ajuda (ofertas) para os irmãos que viviam na Judéia. E assim o fizeram, enviando suas ofertas aos presbíteros pelas mãos de Barnabé e Saulo. As ofertas devem ser “...de livre vontade na medida de seus bens, e até acima disso!” (II Co 8.3). Esse versículo fala de contribuições voluntárias e não de exigências de dízimos. Os coríntios eram ofertantes dispostos e generosos, segundo as suas possibilidades (II Co 8.4), e nada há no capítulo 8 da segunda carta aos Coríntios sobre dízimos.

Paulo pedia ofertas e não dízimos (II Co 8.10), o qual ele aconselha os crentes a fazerem suas contribuições e não exige como fazem nos dias de hoje o dízimo sob pena de maldição.

Paulo diz que deve ser conforme o que cada um possui e não fazer atos de sacrifícios: ...conforme o que alguém possui, e não segundo o que não tem.” (II Co 8.12). Sacrifícios não são para crentes. O Senhor disse ...Misericórdia quero, e não sacrifícios...” (Mt 9.13). Se os adeptos da Doutrina Malaquiana soubessem o que significa “misericórdia quero, e não sacrifícios”, não condenariam os inocentes (Mt 12.7).

Nem o Senhor nem Paulo exigiram o dízimo dos crentes sob pena de maldição caso não obedecessem. A “Lei da Semeadura” em II Co 9 fala de ofertas que devem ser voluntárias, sem exigências, sem determinar um valor específico, com generosidade, segundo as possibilidades de cada um, conforme o proposto no coração e dado com alegria, sem constrangimentos ou pesar (v.7). Tudo isso é diametralmente oposto com o que acontece nos cultos evangélicos de hoje. Usam textos que falam de ofertas como se estivesse falando sobre dízimos, exigem, exigem e exigem. Constrangem a congregação com tantos pedidos de dízimos, ofertas para isso e ofertas alçadas de valores previamente estipulados que os membros já não agüentam mais ouvir tanto sobre dinheiro. Massacram verbalmente o coitado do crente que não quer dizimar por ter entendido pelas Escrituras que o dízimo não é para ele e sim para a nação de Israel. Mary Schultze diz que os cristãos vivem em ditaduras ou democracias, onde muitos impostos são cobrados (aqui no Brasil chegamos a pagar quase 40% de impostos). Portanto, se ele ainda retirar 10% de sua renda bruta, para dar ao “Leão Eclesiástico”, vai empobrecer tanto que não poderá viver dignamente. E para onde vai esse dízimo coletado? Para oferecer uma vida nababesca aos pastores e sua família; para financiar viagens de férias ao exterior; para comprar aparelhos de som barulhentos, que nada edificam os crentes; para a construção de templos suntuosos, na vaidosa corrida entre as denominações - “quem tem o templo maior e mais bonito?”

Li em um dos escritos da irmã Mary que existem vários tipos de dízimo:

O dízimo do medo - quando o crente devolve 10% do que ganhou, com medo que Deus não o abençoe, se ele o sonegar [Esse tipo de coação é muito exercido na cobrança feita pelos pastores malaquianos].

O dízimo da barganha - do tipo prometido a Deus por Jacó (Gênesis 28:22), quando o crente age com Deus como se estivesse fazendo uma aplicação financeira que lhe renda lucro [Este é típico dos crentes que abraçam a “teologia da prosperidade”].

O dízimo da obrigação - Quando a igreja o exige pelo estatuto e o crente se vê na obrigação de obedecer ao mesmo [Um dos meus “filhos” foi excluído de sua igreja por ter sonegado o dízimo e explicado, quando foi abordado pelo pastor, que não iria entregá-lo, apresentando parte da tese defendida em meu livro “O Dízimo do Dízimo”].

O dízimo da graça - Quando o crente dá o que pode e quando pode, sem nenhuma coação, exclusivamente por amor à obra de Deus, em agradecimento pelas bênçãos recebidas, etc.

Já até ouvi, e não foi uma ou duas vezes, mas várias, que o crente tem que dar o dízimo do dia, ou seja, já que o dia possui 24 horas eu devo dar duas horas e quarentas minutos de dízimo para Deus que é para ser usado para as coisas de Deus. É até interessante isso, mas veja que o cálculo está errado, pois dez por cento de 24 horas não são duas horas e quarenta minutos e sim, cento e quarenta e quatro minutos ou duas horas e vinte e quatro minutos, veja por que:

Um dia tem 24 horas, o que é igual a 1440 minutos, pois cada hora possui 60 minutos (60x24). Dez por cento desses 1440 minutos temos 144 minutos, que convertendo para horas temos 2 horas e 24 minutos.

60 minutos

X24 horas

240

120+

1440 minutos

Sabendo que cada hora possui 60 minutos e que 10% de 1440 são 144, teremos 2 horas (ou 120 minutos) e 24 minutos. Continha simples, mas que erram de uma forma assombrosa. Tem gente que nem para fazer heresias presta, pois a Bíblia nada fala de que devemos dar o dízimo de nossos dias.

Frases dos defensores da Doutrina Malaquiana

“O dízimo é mandamento para a Igreja!” – Como pudemos verificar nos textos analisados acima, vemos que o dízimo foi ordenado para a nação de Israel, como herança à tribo de Levi. Em nenhum lugar das Escrituras vemos qualquer ordem aos crentes de que devem ser dizimistas. O Senhor nunca ordenou isso e muito menos os escritores do NT. Paulo diz que os crentes morreram para a Lei (Rm 7.4) e que foram libertados da Lei (Rm 7.6), pois a Lei não tem poder sobre os que morrem, e nós os crentes morremos com Cristo.

“Quem não entrega o dízimo é rebelde!” – O termo rebelde segundo a Bíblia fala acerca daqueles que não obedecem as ordenanças de Deus (conf. I Sm 15.22, 23). Dizer que o crente que não entrega seus dízimos é rebelde, só mostra a ignorância ao aplicar os textos bíblicos. Como o crente pode ser rebelde (ou desobediente) por causa de uma lei que não lhe diz respeito? Como disse Paulo em Rm 4.15: ...mas onde não há Lei também não pode haver transgressão! Releia acima o tópico que fala sobre os tipos de dízimos.

“O dízimo é um ato de sacrifício do crente e pelo seu sacrifício Deus te abençoará!”, “Quem quiser ser abençoado por Deus tem que ser dizimista!” – Se o dízimo é um ato de sacrifício, pois muitos pastores preferem ver seus membros passando fome, mas dando os seus dízimos em dia, logo estamos em transgressão em relação ao Evangelho da Graça, pois o Senhor disse “misericórdia quero, e NÃO sacrifícios...” (Mt 9.13). Se alguém me disser que o dízimo é um ato de fé, por que é que se exige que se entregue os dízimos nas mãos do pastor? Se é exigido, então não pode ser de fé, e sem fé não se pode agradar a Deus (Hb 11.6). Para que um crente possa ser abençoado por Deus, quer espiritual ou financeiramente, tem que fazer o que está dito pelo Senhor em Mt 6.33 que diz: Buscai, assim, em primeiro lugar, o Reino de Deus e a sua justiça, e todas essas coisas vos serão acrescentadas”. Buscar o Reino de Deus e a Sua justiça nada tem a ver com o dízimo.

“Não dar o dízimo é roubar a Deus!”, “Quem não dá o dízimo é ladrão!” – Essas frases servem para impor medo nos membros para que dêem seus dízimos e não serem chamados de ladrões. Chamar um membro de ladrão é uma acusação séria passível de processo judicial por calúnia e difamação. Os pastores que usam a Bíblia (mais precisamente Ml 3.8, 9) deveria ser excluídos do ministério pastoral por falsa acusação e calúnia e principalmente pela má aplicação dos textos sagrados.

“Aquele que não é dizimista não vai para o céu!” – Essa frase juntamente com as duas acima é usada para colocar mais medo ainda nos crentes “infiéis” nos dízimos. Ouvi um pastor da Igreja onde congreguei por quatorze anos dizer do púlpito essa frase. Para mostrar uma suposta base bíblica para essa heresia blasfema, ele usou Ml 3.8, 9 juntamente com I Co 6.10 e concluiu que o crente pode perder a sua salvação se deixar de ser dizimista! O crente é salvo unicamente pela obra vicária de Cristo no Calvário, se eu disser que o dízimo influencia nisso, logo, por que o Senhor teve que morrer crucificado? Seria muito mais simples exigir dízimos para que todos fossem salvos. Acrescentar qualquer obra à cruz de Cristo é dizer que o que o Senhor fez não tem poder suficiente para salvar.

“Deus vai repreender o Devorador (diabo) se você der o dízimo!”- A prática da eisegese impera entre os pastores malaquianos. Eisegese é o oposto da exegese, é colocar outro significado nos textos bíblicos que não está lá. Já ouvi dizer também que só com o dízimo que se repreende o devorador, que nem com oração dá para repreender. Em primeiro lugar, o devorador em Malaquias 3.11 não está grafado com D maiúsculo e sim minúsculo, pois não se trata de um indivíduo. Este devorador nada mais é que qualquer praga que venha consumir as plantações dos israelitas. Isso está bem claro no próprio versículo 11 que diz: “...e ele não destruirá os frutos da vossa terra”. E mais, dizer que o devorador de Ml 3.11 é o diabo é desconhecer por completo os princípios de interpretação da Bíblia que diz que a Bíblia por si só se explica.

“O crente fiel tem a obrigação de dizimar!” – Juntam a palavra fiel com dízimo, para classificar o crente fiel do infiel, ou seja, todo crente fiel é dizimista e todo crente infiel não é dizimista. Para explicar melhor isso é como dizer que para o crente ser fiel, segundo a Doutrina Malaquiana, ele tem que ser fiel é no dízimo. Mas não é isso que a Bíblia deixa transparecer. O crente tem que ser fiel a Deus, e não nos dízimos. Fidelidade na Bíblia refere-se a não trocar Deus por nada e nem por ninguém, é permanecer em Cristo até a morte (conf. Ap 2.10, que nada tem a ver com dízimos).

“Até o descrente que for dizimista Deus abençoa!”- Essa eu ouvi do mesmo pastor que falou que o crente “infiel” não vai para o céu. Para que um descrente venha a ser abençoado por Deus, em primeiro lugar, ele deve aceitar Jesus como Salvador de sua vida (Jo 15.7). E a maior bênção da parte de Cristo não é a bênção financeira, e sim a Salvação Eterna. Se um descrente não quiser aceitar Cristo como Salvador, mas for “dizimista fiel” vai ser abençoado por Deus? Onde está escrito isso na Bíblia? Texto sem contexto é pretexto para a heresia.

“O obreiro que não for dizimista não serve para ser obreiro!”- Essa eu ouvi recentemente. Se para ser obreiro (diácono, presbítero, etc) eu tenho que ser dizimista, então, na verdade eu estarei pagando para ser obreiro, pois ouvi que o obreiro que estivesse por mais de dois meses sem dizimar seria afastado de suas funções. E a consagração que foi levada a efeito com a imposição das mãos dos ministros não é levada em conta? É o mesmo que dizer no momento da consagração “irmão Douglas, eu, o pastor desta igreja, estou te consagrando a presbítero, mas você tem que ser dizimista até o fim, senão vai deixar de ser presbítero, está bem?”. Para ser obreiro tem que ser dizimista, senão, “desconsagra” o obreiro e ele então passa a ser um obreiro “desconsagrado”. E a exigência bíblica para o ministro (obreiros em geral) que consta em I Tm 3.1-13; Tt 1.5-9 não basta? Por que é que não aparece nestes dois textos a exigência de ser dizimista? Se for assim, prefiro não ser obreiro em uma igreja que exige algo que o NT mesmo não diz coisa alguma.

“Jesus ensinou que devemos dar o dízimo e os Apóstolos também ensinaram isso!”- Se o Senhor e os apóstolos ensinaram essa doutrina mosaica aos crentes, eu nunca li. Já li o NT diversas vezes, de ponta a ponta e nunca li esse ensino. Talvez a minha Bíblia esteja incompleta.

“Já que Deus é Dono de tudo e pede apenas dez por cento de sua renda, então, após você pagar seus impostos e comprar o necessário para a sua subsistência, o que sobrar, deve ser dado ao Senhor!”- Essa frase chega às raias da extorsão. Repito o que li em um artigo da irmã Mary Schultze que os cristãos vivem em ditaduras ou democracias, onde muitos impostos são cobrados (aqui no Brasil chegamos a pagar quase 40% de impostos). Portanto, se ele ainda retirar 10% de sua renda bruta, para dar ao “Leão Eclesiástico”, vai empobrecer tanto que não poderá viver dignamente. Imagine se der o restante de sua renda na igreja?

“Deus vai esfregar esterco na cara de quem não é dizimista!”- Essa frase bombástica eu também ouvi recentemente e fiz um esforço muito grande para não sair da igreja no meio dessa declaração do pastor da Igreja. Para dizer uma bizarrice desta foi usado o texto de Ml 2.1-4: Agora, ó sacerdotes, este mandamento é para vós. Se não ouvirdes e se não propuserdes, no vosso coração, dar honra ao meu nome, diz o Senhor dos Exércitos, enviarei a maldição contra vós, e amaldiçoarei as vossas bênçãos; e também já as tenho amaldiçoado, porque não aplicais a isso o coração. Eis que reprovarei a vossa semente, e espalharei esterco sobre os vossos rostos, o esterco das vossas festas solenes; e para junto deste sereis levados. Então sabereis que eu vos enviei este mandamento, para que a minha aliança fosse com Levi, diz o Senhor dos Exércitos.

A aplicação feita com esse texto bíblico fere a hermenêutica e o bom senso teológico que exige que o obreiro aprovado deve manejar bem a Palavra da Verdade (II Tm 2.15) e isso não foi feito aqui. Malaquias inicia o capítulo 2 dizendo “Agora, ó sacerdotes, este mandamento é para vós...”. O capítulo 2 foi escrito aos sacerdotes e não aos crentes. O capítulo dois de Malaquias não fala absolutamente nada sobre os dízimos. Deus disse que esfregaria esterco no rosto deles (sacerdotes) e não no rosto do crente que não fosse dizimista. Os sacerdotes foram censurados porque não davam a honra devida a Deus (v.2), não guardaram os mandamentos referentes aos sacerdotes (vs. 8, 9), fizeram com que muitos tropeçassem no ensino errado que transmitiam (v. 8), corromperam a Aliança feita com a tribo de Levi (v. 8) e também porque faziam acepção de pessoas (v. 9). Em nenhum lugar no capítulo dois de Malaquias vemos que os sacerdotes teriam os rostos cheios de esterco por não terem entregado seus dízimos, e muito menos podemos aplicar essa passagem aos crentes, mesmo que estivesse falando sobre dízimos.

Conclusão

Escrevi este estudo depois que resolvi analisar cuidadosamente o que de fato a Bíblia falava acerca do dízimo. Comecei a verificar, respeitando os princípios que regem a Hermenêutica e a Exegese bíblica, e vi quão equivocados estão os que defendem a Doutrina do Dízimo para os crentes dos dias de hoje. O problema não é se o crente dizima ou não, e sim, as exigências que fazem, da condenação dos que não entregam seus dez por cento na igreja, no massacre verbal que os membros de nossas igrejas tem que ouvir dia após dia. Podemos ver nesse estudo que o crente tem que ser ofertante, ser generoso na oferta, fazer por amor a Deus e a Sua Obra, sem esperar nada em troca, com voluntariedade, sem constrangimento e muito menos porque o “pastor” falou. É assunto entre o crente e Deus, e não para ser exigido a todo custo do crente. A conclusão que cheguei não foi baseada no que a irmã Mary Schultze escreveu sobre o assunto, ou qualquer outra pessoa. Pela misericórdia de Deus, embora eu seja falto no falar, não o sou no conhecimento da Palavra de Deus (II Co 11.6ª). Não tenho a pretensão de dizer que sei mais de Bíblia que a todo mundo, o que de fato não é verdade. Mas sei o suficiente para não ser levado por todo vento de doutrina (Ef 4.14). Sei o suficiente para compreender as doutrinas complexas da Bíblia mediante a revelação do Espírito, o Único autorizado e qualificado para explicar a Palavra que Ele mesmo inspirou. Sei o suficiente para saber acerca da minha salvação que há em Cristo (II Tm 3.15), e não tenho culpa se muitos não querem, ou não se esforçam para aprender a Palavra de Deus. A culpa não é minha se muitos não querem ser sensíveis à voz do Espírito para compreender as Escrituras. Ser sensível à voz do Espírito não é a mesma coisa que chorar quando se ouve um hino, uma pregação, etc, ser sensível à voz do Espírito é também compreender corretamente as Escrituras.

Sei que muitos crentes, mas muitos mesmo, não gostam de ler a Palavra diariamente, não gostam de estudar a Palavra diariamente, não gostam de orar pedindo a Deus entendimento e compreensão da Sua Santa Palavra, mas eu vou continuar lendo a Bíblia diariamente, mesmo que a maioria não faça isso, continuarei a estudar a Bíblia diariamente, mesmo que a maioria não goste de fazer isso e continuarei a orar a Deus pedindo entendimento e compreensão da Sua Palavra como tenho feito há muito tempo, mesmo que isso venha a incomodar a maioria dos crentes preguiçosos. A ordem do Senhor para os crentes continua sendo: “...quem lê, entenda...” (Mt 24.15).

Douglas Diniz – “Fiz-me acaso vosso inimigo, dizendo a verdade?” Gálatas 4.16